| Leocádia Felizardo Prestes (1874- 1943) Ativista Política que enfrentou a Ditadura Vargas e o Nazismo.
Nascida em Porto Alegre (RS), Leocádia Felizardo Prestes era filha de Ermelinda Ferreira de Almeida, descendente da aristocracia portuguesa e de Joaquim José Felizardo, abastado comerciante.
Com os pais aprendeu a valorizar e a lutar pelos ideais de justiça social, ao mesmo tempo em que recebia a rígida educação tradicional de seu tempo destinada às meninas: aprendizado de idiomas, piano, pintura, canto e declamação. Adolescente interessava-se em acompanhar os jornais da Corte, fato pouco comum para as moças. A contragosto dos pais formou-se professora e em várias ocasiões, expressou a eles seu desejo de tornar-se professora de escola pública, o que não lhe foi permitido. Em 1896, por amor, casou-se com Antônio Pereira Prestes, engenheiro militar e ex-aluno de Benjamim Constant, na Escola Militar da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro. O convívio com o marido, adepto do positivismo e que, ainda cadete, participara da Proclamação da República permitiu a Leocádia ampliar seu conhecimento do mundo, bem como, o interesse pela política. Dentre as historias contadas, anos mais tarde, aos filhos, estariam aquelas sobre a ansiedade experimentada pelo casal durante a Guerra dos Canudos. O falecimento do marido colocou-a e aos cinco filhos em difícil situação financeira. Na luta pela sobrevivência, deu aulas de idioma, foi modista e costureira até que, em 1915, conseguiu uma nomeação para atuar como professora em escolas públicas. Como professora durante quinze anos, até 1930, Leocádia atuou em cursos noturnos voltados a trabalhadores (as), em escolas do subúrbio do Rio de Janeiro freqüentemente localizadas no alto dos morros. Travou assim, contato com a dura realidade enfrentada pelas camadas mais empobrecidas da sociedade brasileira, aumentando ainda mais sua indignação contra a injustiça social. Na educação dos filhos, além do pão de cada dia, Leocádia Prestes preocupou-se sempre em alimentá-los também, com o respeito ao próximo, a responsabilidade para com o trabalho e o compromisso pessoal de enfrentar injustiças. Não por acaso, em 1910, adepta da Campanha Civilista de Rui Barbosa, participava dos comícios levando sempre Luiz Carlos Prestes, o filho mais velho. Assim, em 1922, quando Luiz Carlos, já oficial do Exército, se envolve na revolta promovida por alguns oficiais contra o governo, é apoiado pela mãe que, inclusive, aconselha-o a não desistir diante do fracasso do movimento. Durante o levante de 1924, liderado por Prestes, que se espalhou pelo interior do país e durariam até 1927, os anos foram difíceis. As noticias que chegavam do interior vinham apenas dos jornais que apoiavam o governo e eram as piores possíveis. Por sua coragem, apoio ao filho e aos demais participantes, Leocádia Prestes tornou-se uma líder das famílias atingidas. Em 1930, com o filho novamente perseguido pelo governo, entendeu que o mesmo não poderia retornar ao país. Deixando tudo para trás, rumou para a Argentina com as quatro filhas e ficou ao lado de Luiz. Período difícil. Ameaçado de morte pelo governo argentino, Luiz Carlos teve que fugir para o Uruguai. Leocádia - que não mais pisaria no Brasil-, e as filhas, enfrentaram muitas dificuldades para sobreviver em Buenos Aires, onde permaneceram e se aproximaram do marxismo. Em 1931, Leocádia e a família se juntam ao filho na União Soviética. Cinco anos depois, em 1936, com a prisão de Luiz Carlos Prestes- que vivia clandestinamente no Brasil-, e sua mulher Olga Benário, Leocádia é escolhida para encabeçar uma campanha política em defesa da vida do filho e de todos os presos políticos brasileiros. Apesar das dificuldades e da responsabilidade da missão, aos 62 anos, parte de Moscou acompanhada da filha Lygia e percorre os principais países europeus denunciando e pedindo apoio a sua causa. Os comícios, conferências de imprensa, visitas a jornais, contatos com diferentes sindicatos, partidos políticos, parlamentos e chefes de governos deram resultado. De diferentes partes do mundo, o governo brasileiro recebia milhares de protestos. Em pouco tempo Leocádia vê surgir Comitês de defesa de Prestes nos Estados Unidos, na América Latina, na Austrália e na Nova Zelândia. Com a extradição da nora grávida, Olga Benário, para a Alemanha Nazista, Leocádia e a filha vão à Genebra pedir ajuda à Cruz Vermelha Internacional, ação que permitiu receber em 1937, notícias sobre o nascimento da neta Anita. Leocádia esteve ainda, por três vezes, na Alemanha, onde exigiu da Gestapo a libertação da nora e da neta. Também delegações de vários países foram a Berlim interceder pela libertação. Leocádia recebeu Anita nos braços, então com dois anos, apenas em 1938. Não conseguiu, contudo, salvar Olga, executada na câmara de gás do campo de concentração de Ravensbrück, em 1942. Com a chegada da guerra, Leocádia e a neta se exilam no México, de onde prossegue a campanha em favor do filho e companheiros (as). Além de haver perdido contato com as filhas que ficaram em Moscou, preocupa-a também a expansão nazista na Europa. Em junho de 1943, Leocádia Prestes falece sem assistir ao final da guerra e à libertação do filho. Seu enterro foi acompanhado por uma multidão e seu caixão coberto pela bandeira brasileira. Uma guarda de honra levou bandeiras das nações unidas que lutavam contra o nazismo. Além do discurso de representantes de vários países latino americanos, o poeta chileno Pablo Neruda leu o poema Dura Elegia, escrito em homenagem a Leocádia.
DURA ELEGIA* Pablo Neruda (En la tumba de la Senõra Leocadia Prestes) Señora, hiciste grande, más grande, a nuestra América. Le diste un río puro, de colosales aguas: le diste un árbol alto de infinitas raíces: un hijo tuyo digno de su patria profunda. Todos lo hemos querido junto a estas orgullosas flores que cubrirán la tierra en que reposes, todos hemos querido que viniera del fondo de América, a través de la selva y del páramo, para que así tocara tu frente fatigada su noble mano llena de larueles y adioses. Pero otros han venido por el tiempo y la tierra, senõra, y te aconpanãn en este adiós amargo para el que te negaron la boca de tu hijo y a él el encendido corazón que guardabas. Para tu sed negaron el água que creaste. El manantial remoto de su boca apartaron. Y no sirven las lágrimas en esta piedra rota en que duerme una madre de fuego y de claveles. Sombras de América, héroes coronados de furia, de nieve, sangre, océano, tempestad y palomos, aquí: venid al hueco que esta madre en sus ojos guardaba para el claro capitán que esperamos: héroes vivos y muertos de nuestra gran bandera: O'Higgins, Juárez, Cárdenas, Recabarren, Bolívar, Marti, Miranda, Artigas, Sucre, Hidalgo, Morelos, Belgrano, San Martin, Lincoln, Carrera, todos, venid, llenad el hueco de vuestro gran hermano y que Luis Carlos Prestes sienta en su celda el aire, las alas torrenciales de los padres de América. La casa del tirano tiene hoy una presencia grave como un inmenso ángel de piedra, la casa del tirano tiene hoy una visita dolorosa y dormida como una luna eterna, una madre recorre la casa del tirano, una madre de llanto, de venganza, de flores, una madre de luto, de bronce, de victoria, mirará eternamente los ojos del tirano, hasta clavar en ellos nuestro luto mortal. Senõra, hoy heredamos tu lucha y tu congoja. Heredamos tu sangre que no tuvo reposo. Juramos a la tierra que te recibe ahora no dormir ni sonãr hasta que vuelva tu hijo. Y como en tu regazo su cabeza faltava nos hace falta el aire que en tu pecho respira, nos hace falta el cielo que su mano indicaba. Juramos continuar las detenidas venas, las detenida llamas que en tu dolor crecían. Juramos que las piedras que te ven detenerte Van a escuchar los pasos del héroe que regresa. No hay cárcel para Prestes que esconda su diamante, el pequeño tirano quiere ocultar el fuego com sus pequeñas alas de murciélago frio y se envuelve en el turbio silencio de la rata que roba en los pasillos del palacio nocturno. Pero como una brasa e centella y fulgores a través de las barras de hierro calcinado la luz del corazón de Prestes sobresale. Como en las grandes minas del Brasil la esmeralda, como en los grandes rios del Brasil la corriente, y como en nuestros bosques de índole poderosa sobresale una estatua de estrellas y follaje, un árbol de las tierras sedientas del Brasil. Señora , hiciste grande, más grande, a nuestra América. Y tu hijo encadenado combate com nosotros, a nuestro lado, lleno de luz y de grandeza. Nada puede el silencio de la araña implacable contra la tempestad que desde hoy heredamos. Nada pueden los lentos martírios de este tiempo contra su corazón de madera invencible. El látigo y la espada que tus manos de madre pasearon por la tierra como un sol justiciero iluminan las manos que hoy te cubren de tierra. Mañana cambiaremos cuanto hirió tu cabello. Mañana romperemos la dolorosa espina. Mañana inundaremos de luz la tenebrosa cárcel que hay en la tierra. Mañana venceremos. Y nuestro Capitán estará com nosotros.
*Extraído de "Anos tormentosos: Luiz Carlos Prestes: correspondência da prisão (1936-1945)", volume II/Anita Leocadia Prestes e Lygia Prestes (apresentação, seleção e notas).
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